CAMINHO DAS MISSÕES - SEPÉ TIARAJU
Uma lenda, um guerreiro ou um mártir?
Muito se têm escrito sobre o famoso índio guarani Sepé Tiaraju, alguns consideram um grande guerreiro que lutou tenazmente contra a numerosa e aguerrida tropa portuguesa e espanhola que estava incumbida de evacuar as Reduções, endeusando-o a ponto de transformarem em um santo, o Santo Sepé.
Sepé (facho de luz em guarani) era um índio guarani missioneiro, nasceu na Redução de São Luiz Gonzaga, ficando prematuramente órfão de pai e mãe, sendo adotado por um Padre Jesuíta. Posteriormente foi transferido para a Redução de São Miguel Arcanjo. Segundo a lenda, possuía uma pequena cicatriz na testa em forma de uma lua crescente que segundo uns reforçava a capacidade de sobrenatural, a mesma nas noites escuras ou em combate brilhava guiando os soldados missioneiros. Após a sua morte segundo conta à lenda, Nosso Senhor retirou a marca existente em sua testa e projetou-a no céu dos pampas em forma de uma cruz, para servir de guia a todos os gaúchos, nascendo assim o Cruzeiro do Sul.
Sepé Tiaraju passou a personificar os ideais e as crenças missioneiras, tanto que foi canonizado pelo povo, transformando o Corregedor José Tiaraju, em São Sepé. Tal crença ficou tão arraigada no povo que, encravado na região central do Rio Grande do Sul, a 256 quilômetros de Porto Alegre e a 56 quilômetros de Santa Maria, encontramos um município chamado de SÃO SEPÉ criado pela Lei Provincial no. 1029 de 29 de abril de 1876. Conta à história que a comunidade local teve a idéia de construir uma capela em homenagem a Nossa Senhora da Conceição, no entanto a crença popular refuta a idéia e informa que tal denominação deve-se ao índio Sepé Tiaraju.
Documentos históricos, no entanto informa que o nome São Sepé dado ao município, não teve nenhuma ligação com o referido índio, informando, igualmente, que, o município de São Sepé, teve como origem uma Estância Missioneira já existente em 1791, chamada de SAN SEPÉ.
O cacique guarani Sepé Tiaraju era Alferes real do cabildo de São Miguel, suas ações guerreiras nem sempre foram bem planejadas, pois não detinha aquele raciocínio lógico de um exímio combatente, no entanto ele se colocou tenazmente contra a entrega dos Sete Povos aos portugueses mantendo uma feroz resistência.
No começo ele não tinha uma noção clara dos acontecimentos que estavam se desenrolando, tanto assim que, em Santa Tecla (Bagé) no ano de 1753, ordenou o retorno dos demarcadores das novas fronteiras negando naquela oportunidade o fornecimento do gado necessário aos portugueses, mas fornecendo aos espanhóis, por julgar que os mesmos tinham esse direito por servirem ao mesmo rei dos Jesuítas que eram os seus dirigentes espirituais.
Um mês depois, Fernando VI, rei da Espanha, ordenou que as Reduções fossem evacuadas à força, se necessário. Quando isso começou a ser posto em pratica, Sepé Tiaraju se transformou, insuflou o levante de São Nicolau, a primeira Redução a resistir às ordens de transmigração para o lado ocidental do Rio Uruguai. Em São Miguel, chefiados por ele, os índios atacaram as carretas que faziam a mudança dos objetos da igreja, obrigando-as a retornar à Redução. Durante três anos, foi o grande líder dos revoltosos.
Será que poderemos chamar Sepé Tiaraju de “mártir”? Quais os fundamentos que poderíamos utilizar para assim chamá-lo? Ao consultar o nosso dicionário Aurélio, iremos ler: “1. Pessoa que sofreu tormentos, torturas ou a morte, por sustentar a fé cristã. 2. Pessoa que sofre tormentos ou a morte por causa de suas crenças ou opiniões. 3. Quem se sacrifica, sofre ou perde a vida por um trabalho, experiência, etc.”
Poderíamos buscar a compreensão do que é um mártir se olharmos de uma maneira ampla e geral, quando dizemos ter de “sustentar a fé Cristã”, a fé em DEUS na luta pela justiça, pela tranqüilidade do bem viver, da harmonia entre os povos e mais do que isso, pela PAZ.
Monumento a Sepé Tiaraju
Sepé Tiaraju quando se rebelou e passou a resistir às ordens da transmigração, estava lutando pelas suas “crenças ou opiniões”. Assim como ele, os missioneiros Roque Gonzales de Santa Cruz, Juan del Castillo e Afonso Rodrigues, deram as suas vidas, derramando o seu sangue na evangelização dos índios guaranis nas Reduções.
Podemos dizer sem medo de errar, assim como aqueles três evangelizadores foram considerados “autênticos mártires da Igreja”, Sepé Tiaraju foi um mártir em defesa dos seus ideais, de suas opiniões, entregando sua vida, seu bem mais precioso em defesa da sua terra, a terra dos seus companheiros.
Sepé morreu em 7 de fevereiro de 1756, às margens da Sanga da Bica, perto da atual estação rodoviária de São Gabriel. Ele e seus companheiros haviam matado dois dos 300 soldados portugueses, que marchavam de Montevidéu para as Missões. Eles foram perseguidos e numa escaramuça, quando seu cavalo rodou e ele foi ferido pela lança de um dos soldados. Antes que se levantasse, foi morto com um tiro de pistola pelo próprio governador de Montevidéu, José Joaquim, que chefiava a tropa.
Sepé estava tentando atrair o exército inimigo para a estrada da Boca do Monte (atual subida da serra que fica entre Santa Maria e São Martinho). Três dias após a sua morte, os guaranis sofreram a mais devastadora derrota, em apenas uma hora e quinze minutos, na coxilha de Caiboaté (hoje São Gabriel), foram executados entre 1200 a 1700 índios pelos “blandengues” (milicianos contratados em fazendas argentinas), na oportunidade os índios estavam sob o comando de Nicolau Neenguiru, uma pessoa completamente ingênua na arte de combate.
E assim desapareceu um mito, um guerreiro, um mártir. Posteriormente ganhou um monumento que simboliza a família guarani e a sua resistência armada na Guerra Guaranítica (1754 – 1756), na cidade de Santo Ângelo, composto de três figuras esculpidas em pedra grês, idealizado pelo escultor Olindo Donatel que realizou a obra em 1967.