O CAVALO CRIOULO E A PESQUISA CIENTIFICA.
A Universidade Federal de Pelotas desenvolve um trabalho de pesquisa científica inédito na Raça Crioula, buscando as correlações existentes entre morfologia e funcionalidade.
Mais de 640 animais participantes das classificatórias do Freio de Ouro tiveram suas medidas lineares e angulares coletadas pela equipe coordenada pelo professor Dr. Charles Ferreira Martins. O objetivo do trabalho é determinar as correlações existentes entre as medidas corporais e as notas morfológicas com o desempenho funcional na prova.
Pela primeira vez na história da Raça Crioula teremos uma investigação com bases científicas para determinar quais os caracteres morfológicos que influenciam diretamente no desempenho funcional (Freio de Ouro), ou seja, desvendar o que seja o VERDADEIRO BIOTIPO FUNCIONAL.
É de importância vital a investigação científica para uma formulação concreta de parâmetros de avaliação, que com certeza porão fim ao empirismo que até hoje domina nossas avaliações e julgamentos morfológicos.
Parece-me dispensável ressaltar a importância crucial do trabalho, pela sua abrangência e idoneidade, são centenas de correlações que podem ser estabelecidas, confirmando ou pondo fim aos preceitos que valorizam ou penalizam a morfologia do Cavalo Crioulo.
Os conceitos adotados em nossas avaliações morfológicas foram estabelecidos empiricamente há anos atrás, tendo em vista um RUMO FUNCIONAL PARA A RAÇA, fato plenamente justificável exatamente por falta de um estudo técnico científico que embasasse esses conceitos na época.
Muitos desses conceitos adotados empiricamente se mostraram corretos, outros são discutíveis, outros tantos devem ser imediatamente revistos tendo como base técnica científica esse estudo.·.
As conclusões do estudo da UFPEL com certeza auxiliarão no processo seletivo do Cavalo Crioulo, partindo das associações entre características morfológicas e funcionais indispensáveis para o estabelecimento de critérios técnicos da seleção.··.
O trabalho que teve o apoio inicial da ABCCC é coordenado pelo Prof. Charles Ferreira Martins, Dr., e sua equipe de pesquisa: Cláudio Alves Pimentel, PhD, Anelise Hammes Pimentel, MsC., José Carlos Ferrugem Moraes, Dr., João Ricardo Malheiros de Souza (acadêmico) e Gabriel de Marco Flório (acadêmico).
ALGUNS RESULTADOS PRÉVIOS
Mesmo sem a conclusão do trabalho, em NOTA PRÉVIA divulgada pela equipe, já se pode estabelecer algumas correlações que ilustram bem o alcance da pesquisa quando for totalmente concluída (os parágrafos em itálico e entre aspas, são textuais das conclusões da nota prévia):
1 “O perímetro torácico foi a medida linear com maior associação com as distintas provas funcionais, seguida pelas medidas lineares comprimento de pescoço e de metatarso.”.
Os primeiros resultados da Nota Previa demonstram que as melhores notas de trote, galope, figura, VSP esbarrada e campo estão associadas às melhores medidas de perímetro do tórax.
2 O comprimento corporal teve uma associação positiva: no trote, e uma negativa na VSP. Demonstrando que animais excessivamente compridos tem dificuldades nos movimentos laterais, como já era de se esperar.
3 O comprimento do pescoço apresentou uma associação positiva no desempenho do trote do galope e da VSP e o perímetro rostral (garganta) uma associação positiva na pechada. Isto quer dizer que as maiores medidas de pescoço e o maior perímetro rostral tiveram melhor desempenho nessas etapas.
“O perímetro rostral (garganta) foi associado positivamente às notas de galope, volta sobre patas, esbarrada, aparte e pechada”.
4 “As melhores notas de andadura foram associadas às melhores notas das provas que exigiram flexibilidade rotacional, lateral e dorso ventral”.
5 O ângulo da escápula não teve correlação com as notas de galope, porém está associado à qualidade da esbarrada.
6 “O antagonismo de características morfológicas ótimas para uma função específica e pior para outra é o que desafia e estimula a seleção de um cavalo morfologicamente ideal para todas as etapas do Freio de Ouro”.
NOTAS MORFOLÓGICAS E DESEMPENHO FUNCIONAL
A média das notas morfológicas dos 641 animais estudados foi de 6,92 e a média funcional foi de 9,58.
Somente 29% (menos de um terço) dos animais com notas morfológicas acima da média (6,92) mantiveram-se acima da média funcional. Praticamente a mesma porcentagem 28,8% obteve nota morfológica inferior abaixo da média e obtiveram notas funcionais acima da média.
Se considerarmos somente o chamado “primeiro time” ou time da ponta que parte de uma nota morfológica mínima de 7,5 somente 14,5% desses animais obtiveram notas funcionais acima da média (estatística própria, não consta da nota prévia).
A equipe finaliza a nota prévia lançando um alerta:
“Porque 28% dos cavalos com desempenho funcional acima da média estão recebendo menos nota morfológica?
Certamente, eles têm características morfométricas que possibilitam bom desempenho funcional, tão bom quanto os cavalos do quadrante superior direito (bons e bonitos).
O que está sendo buscado no julgamento morfológico atualmente condena estes animais, sabendo-se do peso que a morfologia tem na prova.
Este grupo é muito importante, pois apresentam características funcionais que devem permanecer na raça e se continuarem sendo condenados pela morfologia, provavelmente, não serão utilizados como reprodutores em grande escala, deixando de proliferar características funcionais importantes para a raça.
Segundo Martins, será realizada, futuramente, a análise de diferença entre os dois grupos de cavalos apontados acima, levando-se em consideração a associação entre as características lineares e angulares com as notas funcionais, onde, certamente poderá se encontrar a explicação para tal e apontar caminhos importantes para seleção do Cavalo Crioulo”.·.
A conclusão deste trabalho da UFPEL será um marco divisor na história da Raça Crioula confirmando alguns conceitos e reformulando outros tantos, encontrando respostas para indagações que são fundamentais para estabelecer rumos tecnicamente confiáveis para o futuro.
Os excelentes resultados obtidos na avicultura, na suinocultura na produção de leite e carne, na silvicultura e na agricultura de modo geral nas ultimas décadas tiveram por base a pesquisa científica, sem ela ainda estaríamos reféns de um processo produtivo arcaico e economicamente inviável.
Os investimentos em pesquisa crescem exponencialmente em todas as áreas de produção, permitindo verdadeiros saltos de qualidade daqueles setores que se beneficiam do conhecimento científico e tecnológico na melhoria de seu produto.
Um dos exemplos mais significativos no Brasil é o da Raça Nelore que investe fortemente na pesquisa científica, com destaque para a ANCP Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores, que em vinte anos de existência concluiu 394 trabalhos de pesquisa para que o Nelore alcançasse os elevados patamares de produtividade que alcançou.
A disponibilidade dos pesquisadores da UFPEL em desenvolver pesquisas científicas sobre o Cavalo Crioulo deve ser valorizada, incentivada e principalmente custeada pela ABCCC.
É bom ressaltar que a equipe de pesquisadores não tem absolutamente nenhuma obrigação em trabalhar nesta área, se o faz, é por pura dedicação científica e vinculação cultural com o Cavalo Crioulo.
É louvável o apoio da ABCCC ao estudo, apesar de tímido diante da magnitude da pesquisa e dos benefícios que por certo desfrutaremos com seus resultados.
Tenho certeza que a diretoria da ABCCC tem a sensibilidade suficiente para avaliar a importância e a premente necessidade de aporte de recursos que permitam a continuidade do trabalho.
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